A administração Bush não crê na democracia em nível mundial

A administração Bush não crê na democracia em nivel mundial

Joseph STIGLITZ


Joseph E. Stiglitz é uma das vozes mais autorizadas para criticar os excessos do pensamento econômico neoliberal e as falhas das instituições que o promovem. Não é em vão que conhece como ninguém, seu funcionamento. Tendo estudado no Massachusetts Institute od Technology e nas universidades de Yale e Stanford, Stiglitz, de 63 anos, foi assessor do ex-presidente Clinton em 1993. Em 1997 foi nomeado economista chefe do Banco Mundial. Suas críticas abertas converteram-no em uma incômoda presença no organismo multilateral e em 2000 abandonou seu posto para voltar ao exercício docente e a pesquisa na Universidade de Columbia. Em 2001 lhe foi concedido o prêmio Nobel de Economia.

Pergunta. A tragédia do Katrina revelou o Terceiro Mundo que existe dentro dos Estados Unidos. Que ele diz de seu modelo econômico?

Resposta. O mero crescimento do PIB não é uma boa medida do estado para a economia. A questão é o que acontece ao cidadão mediano. Se bem o PIB vem crescendo nos últimos anos, o cidadão mediano dos Estados Unidos tem empobrecido. A renda familiar caiu cerca de 1.400 dólares nos quatro primeiros anos da Administração Busch. Além disso, a porcentagem da população sem seguro médico aumentou. EEUU tem a maior população de presos proporcionalmente que um pais tenha na atualidade e, se esta fosse incluída na taxa de desempregados, esta seria mais alta, mas não é incluída porque eles não têm a opção de procurar empregos. Quando estava em Washington já falava de que a esperança de vida de um homem negro de idade entre 25 e 30 anos em Washington e Nova York era similar a de um país pobre como Bangladesh. Era sabido que havia problemas, mas a opinião pública não se tinha chegado a tomar consciência disto. De repente, a gente viu isto na televisão. Já não era estatística de esperança de vida, e sim rostos de pessoas. Igual ao que acontece em países menos desenvolvidos, onde os governos estão controlados por elites insensíveis às preocupações dos pobres, isso está acontecendo nos EEUU, desgraçadamente. Em parte isto se deve a falhas em nosso sistema político, que o corrompem. Não é que se compre os políticos, como acontece em muitos países, mas se fazem doações para as campanhas e quando se faz um investimento em um partido político, se espera uma recompensa...; e a têm conseguido!

Pergunta. A utilidade do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial estão sendo questionadas. Como deveria ser apresentada a sua razão de ser hoje em dia?

Resposta. A questão não é se têm razão de ser, porque em um período de globalização no qual existe cada vez mais integração econômica se torna ainda mais necessária a ação coletiva. Existe mais necessidade de instituições internacionais. O problema é o jogo político. Durante a guerra Fria, Europa e EEUU tinham um objetivo bem definido. As instituições falavam de desenvolvimento, mas por trás disto havia um objetivo político. Agora, sobretudo desde 2001, está muito claro que a Administração Bush não crê na democracia em escala mundial, nas instituições. Sua política é o unilateralismo e o unilateralismo não é coerente com a democracia. Querem poder de veto.

Pergunta. Que margem tem o diretor gerente do FMI, Rodrigo rato, para promover uma mudança?

Resposta. Tem uma dificuldade e é que EEUU é o único país que tem poder de veto sobre qualquer coisa importante no FMI. Toda grande reforma que suponha uma democratização interna provavelmente será vetada. Mas existe uma margem ampla para reforma informal, por exemplo, mediante a criação de um comitê que estude o desemprego. Mas o problema não é apenas EEUU, e sim a burocracia interna, que é muito poderosa. Enquanto o diretor muda, a burocracia permanece e muito provavelmente resistirá a qualquer mudança.

Pergunta. O Senhor acredita que o FMI deveria reconhecer suas falhas sobre a imposição das políticas do Consenso de Washington nos últimos anos em alguns países para poder recuperar sua credibilidade?

Resposta. Creio que sim, mas deveria ir além do reconhecimento do erro e analisar o porquê esse erro foi cometido. Foi porque se acreditou que uma regra única valia para todos? Ou por que se tinha uma regra particular? Uma de minhas críticas tem sido que muitos modelos partem da premissa de que a informação e os mercados são perfeitos, que são más presunções para qualquer país, mas são muito piores em desenvolvimento.

Isabel LAFONT, EL PAÍS, Madri

 

Joseph STIGLITZ

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