Caminhar com Jesus para a liberdade
Caminhar com Jesus para a Liberdade
José Antonio Pagola
1. Jesus, profeta livre e libertador
Deus não encarnou num sacerdote do tempo, preocupado em defender a religião, nem mesmo encarnou num mestre da lei, dedicado a defender a ordem legal de Israel. Deus tomou carne num profeta, entregue inteiramente à libertação da vida. Os camponeses da Galileia vêem os gestos libertadores de Jesus e nas suas palavras de fogo um homem movido pelo espírito profético: “Um grande profeta surgiu entre nós” (Marcos 1,27).
Jesus é um profeta livre. Não forma parte da estrutura imperial de Roma. Não pertence à instituição religiosa do tempo de Jerusalém. Não é ordenado nem ungido por ninguém. A sua autoridade não lhe vem de nenhuma Instituição. Obedece apenas ao Pai. Apenas procura abrir caminhos a um Deus que quer um mundo novo, liberto de todo o mal.
Jesus é um profeta libertador. Dois gritos revelam-nos o seu projeto libertador. O primeiro dirige-se ao Império de Roma: “Os governadores das nações tem poder sobre elas e os grandes tem autoridade sobre elas. Entre vocês não deverá ser assim” (Mateus 20, 25-26). Deus está contra todos os poderes opressores. O segundo está dirigido a Jerusalém: “Na cátedra de Moisés sentaram-se os escribas e os fariseus… Amarram pesados fardos e os colocam nos ombros dos outros, mas eles mesmos não estão dispostos a movê-los” (Mateus 23,2-4).
Não deve ser assim. Deus está contra qualquer religião opressora.
2. A experiência de um Deus livre
Jesus vive a sua atividade profética a partir da experiência de um Deus que é livre para abrir caminhos ao seu Projeto de libertar o mundo da escravidão, da opressão e dos abusos contra os seus filhos e filhas. Não se tem de seguir os caminhos assinalados pelos dirigentes religiosos fechados a qualquer novidade, considerando-a uma ameaça para a ordem estabelecida. Não se tem de ajustar às ambições dos poderosos que exploram sem piedade aos pobres.
Por isso, enquanto os dirigentes religiosos vinculam a Deus com o seu sistema religioso e se preocupam em assegurar o culto do tempo, o cumprimento das leis ou a observância do sábado, Jesus põe a Deus ao serviço de uma vida liberta. Primeiro está o projeto libertador do Reino, não a religião; a cura dos enfermos, não o sábado; a reconciliação social, não as oferendas que cada um leva ao altar.
E, por isso também, Jesus põe a Deus, não ao serviço dos poderosos e privilegiados, mas a favor dos pobres: os excluídos pelo Império e os esquecidos pelo tempo. Deus não é propriedade de ninguém. Não pertence aos bons: “faz sair o sol sobre bons e maus e a chuva cair sobre justos e injustos” (Mateus 5,45). Não está amarrado a nenhum tempo nem lugar sagrado. Não pertence aos sacerdotes de Jerusalém nem aos mestres da lei. Em qualquer lugar o ser humano pode elevar os olhos ao céu e invocá-lo como Pai.
3. Liberdade para libertar a vida
Jesus é livre, mas não para viver cultivando a sua própria autonomia. É livre, mas não para reclamar e exercitar egoisticamente os seus próprios direitos. É livre, mas não para se realizar a si próprio, à margem de todos os que sofrem. A liberdade de Jesus é uma liberdade para fazer o bem e construir um mundo mais humano. Uma liberdade que nasce da sua experiência de um Deus libertador e se orienta sempre em libertar a vida de tudo o que a pode desumanizar e destruir. A liberdade de Jesus é uma Boa-Notícia para todos.
Jesus é livre para denunciar o pecado e para se sentar a comer fraternalmente com os pecadores. Livre para bendizer e para maldizer, para defender os oprimidos e para se hospedar em casa do poderoso Zaqueu. Livre para acudir ao sábado à sinagoga e para ali mesmo violar a lei do descanso curando um enfermo. A liberdade de Jesus é uma liberdade sumamente livre, que só se deixa guiar pelo projeto libertador do Pai, e é capaz de entregar a sua vida em torná-lo realidade para todos. “Ninguém tira a minha vida; eu a dou livremente” (João 10,18).
4. Impulsionador de um processo de libertação individual e social
Quando Jesus se aproxima dos enfermos, não procura apenas resolver um problema físico, mas também libertar a sua vida curando-a desde as suas raízes. Ao contatar com Jesus, o enfermo recupera a confiança em Deus, o amigo da vida; liberta-se da culpa e do medo; reafirma-se na sua dignidade; sente-se reconciliado com a vida, liberto da exclusão e da mendicidade, devolvido de novo à convivência com os seus seres queridos.
Ao mesmo tempo, Jesus põe em marcha um processo de cura social para caminhar para uma convivência mais sã e liberta. Pensemos nos seus esforços em criar relações mais humanas entre pessoas que se respeitem mais, se compreendam melhor e se perdoem sem condições (Mateus 5,21-26; 7,15; 18,21-22). As suas chamadas a uma vida libertada da escravidão do dinheiro e da obsessão pelas coisas (Mateus 6,21; 6,24). O seu empenho em libertar a todos do medo para viver na confiança absoluto no Pai (Mateus 10,30-31; 6,25-34). A sua oferta do perdão a pessoas afundadas no fracasso moral e na ruptura interior (Marcos 2,1-12; Lucas 7,36-50; João 8,1-11).
Temos de destacar o esforço de Jesus em curar a religião, libertando-a de tantos comportamentos patológicos de raíz religiosa (legalismo, hipocrisia, rigorismo, culto vazio de justiça e de amor). Jesus é um grande curador da religião: liberta dos medos religiosos, não os introduz; faz crescer a liberdade, não as escravidões; atrai para o amor de Deus, não para a lei; desperta a compaixão, não o ressentimento.
5. Amigo libertador da mulher
Jesus põe um fim ao privilégio machista dos varões judeus, que podiam repudiar as esposas expulsando-as do lar, e defende o projeto original de Deus sobre o matrimónio. Deus “criou-os homem e mulher” à sua imagem. Não criou ao varão com poder sobre a mulher. Não criou a mulher submetida ao varão. Com esta posição, Jesus está destruindo radicalmente o fundamento do patriarcado sob todas as suas formas de controle, submissão e imposição do varão sobre a mulher.
Deus não abençoa nenhuma estrutura que gere um domínio do varão e submissão da mulher. No Reino de Deus tais estruturas terão de desaparecer. Por isso, Jesus acolhe como seguidores não apenas a varões, mas também a mulheres. Todos são irmãos e irmãs, com igual dignidade. Desaparece a autoridade patriarcal. Não chamarão Pai a ninguém, a não ser ao do céu (Mateus 23,9). A nova família que se vai formando em torno de Jesus é um espaço sem dominação masculina.
6. A verdade de Jesus nos fará livres
Existe um traço básico que define a liberdade profética de Jesus: a sua vontade de viver na verdade de Deus. Jesus não diz apenas a verdade, mas também procura a verdade e apenas a verdade de Deus que quer um mundo mais humano para todos os seus filhos e filhas. Fala com autoridade porque fala a partir dessa verdade. Não fala como os fanáticos que tratam de impor a sua verdade, nem como os funcionários que a defendem por obrigação. Não se sente guardião da verdade, mas testemunha dela.
Jesus é livre para gritar a verdade do Deus do Reino. A sua promessa é clara: “Se vocês guardarem a minha palavra, vocês de fato serão meus discípulosos, conhecerão a verdade e a verdade libertará vocês” (João 8, 31-32). Se nos mantivermos na Palavra de Jesus, conheceremos a verdade que nos fará livres:
• Seremos libertos dos medos que afogam a alegria e a criatividade na Igreja, impedindo-nos de procurar com sinceridade a verdade do Evangelho e paralisando-nos de abrir caminhos ao Reino de Deus.
• Romperemos silêncios. Se despertará na Igreja a liberdade profética. Se escutará a palavra do Povo de Deus, emudecida durante séculos. Os simples crentes pronunciarão em alta voz palavras boas, curadoras, consoladoras. Se escutará não apenas a palavra daqueles que falam em nome da Instituição, mas também a daqueles que vivem animados pelo Evangelho.
• Despertaremos a esperança. Seguindo a Jesus, “seremos a voz dos sem-voz e voz contra os que têm demasiada voz” (Jon Sobrino). Esta voz humilde, mas livre e forte, é mais necessária do que nunca no interior da comunidade mundial e no seio da Igreja. Esta voz pode reavivar a esperança na libertação final, quando “Deus vai enxugar toda lágrima dos olhos deles, pois nunca mais haverá morte, nem luto, nem grito, nem dor. Sim! As coisas antigas desapareceram” (Apocalipse 21,4).
José Antonio Pagola
San Sebastián, Donosti, País Basco, Espanha