Dom Pedro Casaldáliga: Poeta, Bispo e Profeta

 

Benedito Ferraro

Dom Pedro Casaldáliga é uma referência para a Igreja Povo de Deus, saída do Vaticano II, e um incentivador e dinamizador da Igreja dos Pobres, saída de Medellín. Ele encarnou em sua vida a opção pelos pobres e foi coerente no seguimento de Jesus de Nazaré. Em seus belos e profundos poemas, retrata com maestria, sabedoria e sabor o sentido profundo da encarnação a partir de Jo 1,14:

"E o Verbo se fez classe"
"No ventre de Maria
Deus se fez homem.
Mas, na oficina de José
Deus também se fez classe
."

“E o Verbo se fez índio”.

O Verbo se fez carne

O Verbo se fez pobre

O Verbo se faz índio...

Planta entre nós sua maloca”.

 Como podemos falar de Pedro Casaldáliga?

Seguindo sua trajetória de vida, podemos compreender a densidade histórica que D. Pedro vivenciou e manifestou a todos e todas que com ele conviveram. Pedro é poeta, profeta, revolucionário internacionalista, ecologista, defensor das causas indígena e negra, solidário.

Pedro Poeta: Suas poesias e seus poemas estão sempre articulados com a vida, com a natureza, com as lutas dos trabalhadores e trabalhadoras: indígenas, posseiros, peões, ribeirinhos, migrantes. Tomemos um poema seu, que se articula com o trabalho e a ação política

Canção da foice e o feixe

Colhendo o arroz dos posseiros
    de Santa Terezinha,
    perseguidos
    pelo Governo e pelo Latifúndio.

Com um calo por anel,
monsenhor cortava arroz.
Monsenhor “martelo
e foice”?

Me chamarão subversivo.
E lhes direi: eu o sou.
Por meu Povo em luta, vivo.
Com meu Povo em marcha, vou.

Tenho fé de guerrilheiro
e amor de revolução.
E entre Evangelho e canção
sofro e digo o que quero.
Se escandalizo, primeiro
queimei o próprio coração
ao fogo desta Paixão,
cruz de Seu mesmo Madeiro.

Incito à subversão
contra o Poder e o Dinheiro.
Quero subverter a Lei
que perverte ao Povo em grei
e ao Governo em carniceiro.
(Meu Pastor se faz Cordeiro.
Servidor se fez meu Rei.)

Creio na Internacional
das frontes alevantadas,
da voz de igual a igual
e das mãos enlaçadas…
E chamo a Ordem de mal,
e ao Progresso de mentira.
Tenho menos paz que ira.
Tenho mais amor que paz.

… Creio na foice e no feixe
destas espigas caídas:
uma Morte e tantas vidas!
Creio nesta foice que avança
– sob este sol sem disfarce
e na comum Esperança –
tão encurvada e tenaz!
(Antologia Retirante – poemas, Dom Pedro Casaldáliga)

Pedro Profeta: Por sua defesa dos posseiros, ribeirinhos, indígenas, peões, D. Pedro Casaldáliga sofreu inúmeras perseguições e ameaças de morte, seguindo os passos dos mártires e do mártir maior, Jesus de Nazaré. Também foi alvo de cinco processos de expulsão do Brasil, tendo como defensores Dom Paulo Evaristo Arns e o próprio Paulo VI: “Tocar em D. Pedro é como tocar no Papa Paulo VI”!

Em 1976, escapou de ser morto pelo fato de um soldado achar que o Pe. João Bosco Penido Burnier fosse o bispo, por ter uma postura maior, estar melhor vestido, ao passo que Dom Pedro, pequeno, de sandálias havaianas, não parecia ser bispo! Esta ação foi para defender duas mulheres que estavam sendo torturadas na delegacia local. Fato memorável é que, na missa de sétimo dia, a população seguiu em procissão até a porta da delegacia, libertando os presos e destruindo o prédio. Naquele mesmo lugar, foi erigido o Santuário dos Mártires da Caminhada, em Ribeirão Cascalheira.

Pedro Revolucionário Internacionalista: Como amante da Pátria Grande, defendeu as revoluções Cubana, Nicaraguense, a luta de El Salvador, apoiando as lutas do povo oprimido e saudando os mártires como D. Oscar Romero, Che Guevara.

 Pedro Ecologista: Sempre defendeu os povos originários (povos indígenas) como verdadeiros ecologistas e defensores da natureza. Exigia o reconhecimento dos Direitos da Mãe Terra (Pacha Mama). Nisto ele antecipou o que o Papa Francisco proclama hoje com a Laudato Sí – Cuidado da Casa Comum.

 Pedro Defensor das causas indígenas e negra: Deixou gravada sua opção pelos povos indígenas ao produzir, junto com Pedro Tierra e Martín Coplas, a Missa da Terra Sem Males, que denuncia o genocídio, o etnocídio e o biocídio. A sua defesa da causa dos negros e negras ficou gravada na Missa dos Quilombos, com Pedro Tierra e Milton Nascimento, onde se denuncia a escravidão, e mostra a originalidade da cultura afro e o seu valor de hospitalidade, acolhida.

 Pedro se fez peão com os peões, se fez indígena com os indígenas e solidário com quem Deus se solidarizou em Jesus de Nazaré: Os abandonados e abandonadas, os excluídos e excluídas: Para manter este compromisso com os pobres, D. Pedro pediu e foi sepultado no cemitério do Povo Carajá, bem perto do Rio Araguaia, onde sempre se colocou para meditar e se maravilhar com as belezas da natureza, que ele tanto amou e buscou preservar. Quis ficar perto daqueles com quem ele sempre amou e buscou a libertação.

Pedro Casaldáliga foi a dádiva que Deus enviou ao Brasil. Com ele, a profecia esteve sempre presente, como sempre pregaram D. Helder Câmara e Dom Paulo Evaristo Arns. E juntamente com a profecia, Dom Pedro manteve presente, em sua vida, a Esperança Esperançada. Que sua vida e seu legado possam estar presentes em nossas vidas e em nossa ação política e pastoral, em busca da Justiça do Reino que Dom Pedro Casaldáliga sempre buscou durante toda sua vida. Que, como luz que brilha no firmamento do céu, ele nos ajude a levar adiante a missão que Jesus de Nazaré nos deixou: “Que todos e todas tenham vida e vida em plenitude” (Jo 10,10).

O Testemunho de Pedro Casaldáliga nos desafia:

  1. Leia as mensagens e poemas que falam de Pedro – tanto os que estão nesta sessão, como de outros de seus escritos.
  2. Ao ler, destaque as passagens que mais o tocam...
  3. Com elas, elabore um testamento, que inspire sua prática.