Informe sobre os informes sobre direitos humanos
Informe sobre
os informes sobre Direitos Humanos
José Manuel Fajardo
San Pedro Sula, Honduras
Nosso objetivo é o de resenhar, da forma mais sucinta possível, uma série de informações sobre Direitos Humanos elaborados por organizações de prestígio internacional, de forma a facilitar o acesso a referências chaves para aqueles que desejam informar-se sobre a situação dos Direitos Humanos em nível mundial. Para não sobrecarregar este texto com endereços online ilegíveis e difíceis de digitar, colocaremos todos os documentos aqui citados no arquivo pdf: latinoamericana.org/2015/info/info-ddhh.pdf. Por meio dele você acessará documentos e informes apenas com alguns cliques.
NAÇÕES UNIDAS
Considerando que a Organização das Nações Unidas é a instância mundial mais emblemática em relação ao nosso tema, já que suas origens institucionais estão na Declaração Universal dos Direitos Humanos que dá sentido a toda sua prática, resenhamos o Informe 2013 da Alta Comissária de Direitos Humanos, a sul-africana Navi Pillay, nesse cargo desde 2008.
Este informativo, disponível em seis idiomas por meio da assinatura A/68/36 do Sistema de Arquivos e Documentação das Nações Unidas (SADD u ODS), tem um claro e marcado sabor institucional, pois seu objetivo, mais que informar acerca da situação exata dos Direitos Humanos no mundo, é o de expressar como o escritório do Alto Comissariado para os Direitos Humanos (ACNUDH) se posiciona diante desta problemática.
Não obstante, o que dissemos acima, é válido rever as seis prioridades temáticas da ACNUDH , já que se concentram nos “nós górdios”, isto é, assinalam quais áreas dos Direitos Humanos que, em nível mundial, requerem maior atenção pelas solicitações de intervenção que chegam ao Comissariado, inciando com o fortalecimento dos mecanismos de Direitos Humanos, até a proteção deles em situações de conflito armado, violência e insegurança.
As prioridades são apresentadas ao longo de 22 páginas de texto, as quais levantam dados de interesse como: a atenção a casos urgentes tais como o da República Árabe da Síria, salientando que as situações dos países são cada vez mais transregionais; o exame periódico universal (uma espécie de teste que padroniza a situação de Direitos Humanos de cada país membro, a cada três anos) inicia o seu segundo ciclo, recebendo 20.000 recomendações (uma média de 120 por país) que estão compiladas no Índice Universal dos Direitos Humanos; comemoração do Dia Internacional da Eliminação da Discriminação Racial, organizando-se um ato junto à FIFA, que reuniu jogadores, agentes e representantes do futebol no mundo; na Mauritânia, executou-se um projeto para reabilitar e dar formação a antigos escravos, de forma a facilitar sua integração na sociedade; na Papua-Nova Guiné contribuiu-se com a eliminação da Lei da Bruxaria; em julho de 2013 trabalhou-se em uma campanha a favor dos Direitos Humanos de lésbicas, gays, bissexuais e transexuais; o Conselho dos Direitos Humanos aprovou a resolução 23/13 sobre os ataques e a discriminação contra pessoas albinas; em dezembro de 1012 publicou-se os Indicadores de Direitos Humanos. Guia para mensuração e aplicação para ajudar os Estados a incorporar os Direitos Humanos em seus planos e programas nacionais, assim como na agenda para o desenvolvimento depois de 2015.
Em seu discurso de 14 de abril de 2014, o ACNUDH apresentou seu plano estratégico de gestão 2014-2017, com a novidade de agora atuar por projeções de quatro anos e incluir como prioridade a “ampliação do espaço democrático”.
Para terminar, há três referências na internet do ACNUDH de grande interesse para monitorar a situação dos Direitos Humanos em países específicos, com dados recentes e confiáveis: a primeira diz respeito a um mapa interativo, no qual podemos ver as diferentes regiões do mundo e de cada Estado membro das Nações Unidas; a segunda referência é o Exame Periódico Universal, no qual recolhem-se as observações das Comissões que visitam e avaliam a situação de Direitos Humanos em cada Estado, marcando o calendário de visitas de 2012 a 2016; e para terminar, a Biblioteca Dag Hammarskjöld das Nações Unidas que, por meio de um portal amigável, explica os conformes institucionais que regem as Nações Unidas quanto à defesa dos Direitos Humanos e lista as referências pertinentes para textos e documentação.
PNUD
O informe anual do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento é outra referência interessante sobre o mesmo tema. Em que sentido? O Informe Mundial desta instituição para o ano 2000 nos trás algumas luzes sobre o assunto. No contexto da guerra fria e devido à retórica política dominante desde então, concebia-se a humanidade presa em uma espécie de competição entre os direitos civis e políticos versus os direitos econômicos e sociais. Nas palavras do Administrador Geral do PNUD desta época, Mark Malloch Brown, eram duas visões que competiam pelo futuro do mundo. Chegou-se agora ao reconhecimento geral – ainda que nem sempre a uma convicção compartilhada na prática – de que os dois conjuntos de direitos estão indissoluvelmente associados, são duas caras da mesma moeda. Revisar o referido informe é um exercício salutar para avaliar pessoalmente a compatibilidade e as sinergias mútuas entre Desenvolvimento Humano e Direitos Humanos.
Uma vez justificada a inclusão deste informe para enforcar os Direitos Humanos no mundo e, particularmente na América Latina, temos também o Sumário do Informe Mundial do ano 2013 (28 páginas, incluindo prólogo, cinco capítulos e anexo estatístico), intitulado A ascensão do Sul: progresso humano em um mundo diverso.
Com a leitura deste informe podemos constatar o que foi previsto no informe do ano 2000, na medida em que se registrou uma “surpreendente transformação de um bom número de países em desenvolvimento em economias importantes, dinâmicas e com crescente influência política, que estão impactando significativamente no progresso do desenvolvimento humano na região (prólogo do Sumário com alguns adendos). Os casos do Brasil, China e Índia, cujas economias, a partir do ano 2020, superaram a produção total de vários países do G8, são um sinal palpável de como a dimensão cívico-política e econômico-social estão entrelaçadas. Como também é salientado no Informe, a relação não é automática: crescimento econômico não se traduz em progresso do desenvolvimento humano sem políticas civis ajustadas. Por isso, tanto no nível local como mundial, o Informe sugere uma nova governança para um mundo mais justo e igualitário. A lição é: os direitos devem atuar em sinergia caso almejemos um produto integral.
Em um olhar mais próximo junto a nosso espaço latino-americano temos o Informe Regional de Desenvolvimento Humano 2013-2014, de 285 páginas, intitulado “Segurança Cidadã com rosto humano: dagnóstico e propostas para a América Latina”. Por um lado constata-se a presença econômica da América Latina no nível mundial; por outro lado, registram-se aumentos alarmantes nos números relativos à segurança, com mais de 100.000 homicídios por ano (entre 2000 e 2010 a taxa de homicídios da região cresceu 11%, enquanto que na maioria das regiões do mundo houve diminuição ou estabilização desta taxa; em uma década morreram mais de 1 milhão de pessoas na América Latina e Caribe por conta da violência criminal; os roubos quase triplicaram nos últimos 24 anos).
Este nível de insegurança impede o desenvolvimento humano e, em relação ao nosso tema, prejudica o núcleo básico onde repousam os Direitos Humanos: a vida e a integridade física e material das pessoas. A leitura atenta deste Informe nos permite considerar a necessidade de recuperar o Direito Humano à tranquilidade social, mas como diz o título: com rosto humano, sem necessidade de recorrer à “justiça pelas próprias mãos” ou a políticas de “mão dura” que no fim são completamente contraprodutivas para os Direitos Humanos.
Esse Informe é complementado por outro produzido pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em dezembro de 2009, Informe sobre a Segurança Cidadã e os Direitos Humanos, que na terceira edição do seu resumo executivo já salientava que a delinquência tomou o lugar do desemprego como principal preocupação da população, sendo os jovens o grupo mais afetado enquanto vítimas e criminosos.
CEPAL, Comissão Econômica para a América Latina e Caribe das Nações Unidas
Seguindo a lógica de argumentação prévia, onde os Direitos Humanos, tanto em sua constituição econômico-social como político-civil, são valorizados e pujantes em sua integridade, é pertinente revisar a perspectiva cepalina, a qual nos dá pistas sobre o estado da região quanto a sua economia, a partir de uma reflexão confiável e séria.
O documento a ser examinado é uma publicação conjunta do Centro de Desenvolvimento da OCDE, CEPAL e a CAF, Banco de Desenvolvimento da América Latina. Intitula-se Perspectivas Econômicas da América Latina 2014. Logística e Competitividade para o Desenvolvimento, em um total de 169 páginas.
A estrutura do Informe apresenta três capítulos de temas que supostamente serão mantidos em edições futuras, os quais são: o panorama macroeconômico, América Latina frente ao deslocamento da riqueza mundial, e o desenvolvimento produtivo para a mudança estrutural. O dado fundamental, introduzido pelo texto é o fato de, a primeira década do século XXI (2003 a 2012), ter refletido um crescimento médio anual de 4% para a América Latina. Isso significou avanços quanto à redução da pobreza e um fortalecimento de uma “classe média emergente”. No entanto, e já referindo-se à segunda década deste século, o quadro não é tão lisonjeiro, uma vez que, por várias razões, há uma desaceleração econômica global que impacta em uma redução no crescimento econômico latino-americano. Tal situação insta a necessidade de criação de novos mecanismos de competição e estrutura produtiva.
Não cabe a nós aprofundar aqui os dados do informe, mas ressaltamos a importância de levá-los em consideração para melhor contextualizar o “momento econômico” que serve de ambiente ao estado atual dos Direitos Humanos na região.
Anistia Internacional
Movimento global com mais de 50 anos e mais de três milhões de apoiadores, a Anistia Internacional nos brinda com o Informe 2013, o qual recolheu dados sobre violações aos Direitos Humanos em 2012. Através de uma lista alfabética, este informe apresenta a situação de 159 países ao longo de suas 367 páginas, começando pelo Afeganistão e terminando pelo Zimbábue. Junto ao quadro que serve de título a cada país, introduz-se o nome do Chefe de Estado e de Governo e, em seguida, em negrito, um extrato de dados relacionados aos Direitos Humanos e um índice com subtítulos. Para respaldar os dados ao fim de cada descrição apresenta-se quando ocorreram as visitas a cada país pela Anistia Internacional.
No prólogo do texto, o secretário-geral Salil Shetty lembra a doutrina da “Responsabilidade de Proteger” pactuada na ONU em 2005, criticando a atitude dos Estados que violam os Direitos Humanos dos seus cidadãos com a desculpa de proteger a soberania nacional. Reflete-se sobre este manejo ruim do conceito de soberania e de vários exemplos eloquentes, em que se destaca o caso especial da Síria, onde contabilizava-se, em 2012, 60 mil vítimas da guerra civil.
“É injustificável a inação em nome do respeito à soberania de Estado”, diz ainda o secretário-geral e dá como exemplo o tratamento dispensado aos indígenas nas últimas décadas. Desde os Sawhoyamaxa do Paraguai até comunidades indígenas do Canadá, são ameaçados por deslocamentos forçados ou o uso de seus territórios para fins comerciais. E esta dimensão comercial financeira, que é global e não tem qualquer tipo de oposição efetiva, contrasta com os problemas aportados à circulação de pessoas que migram por motivos de trabalho. Assim, a Convenção Internacional da ONU sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migratórios e de seus Familiares, adotada em 1990, continua sendo um dos acordos de Direitos Humanos menos ratificados pelos países. E isto é ampliado no caso dos apátridas, que são 12 milhões no mundo, sendo 80% deles mulheres.
Duzentas pessoas morrem a cada ano tentando cruzar o deserto para chegar aos EUA; migrantes africanos foram obrigados a distanciar-se da costa italiana como salvaguarda para a segurança do litoral europeu; tanto o governo australiano como a Guarda costeira dos EUA interceptam migrantes no mar e procuram devolvê-los a seus países de origem, imediatamente. Dá-se mais importância à soberania que ao direito das pessoas de solicitar asilo. Isto contrasta com a liberdade que o capital tem para cruzar fronteiras indiscriminadamente e também com a circulação de armas convencionais que movimenta 70 bilhões de dólares anuais.
Contudo, há algo positivo: o fato de que tomamos conhecimento disso tudo. Cada vez é menos possível para governos autocratas e violadores dos Direitos Humanos se esconderem atrás das fronteiras de sua “soberania”. Desde 1985 até 2012, 2,5 brilhões de pessoas ganharam acesso à internet. Desde 1996, com o Hotmail, seguindo-se com os blogs, Wikipedia, Facebook, Youtube, Twitter, chega-se a 2008 com mais pessoas conectadas à internet na China que nos EUA. Graças à internet, estamos destinados a nos ajustar a um modelo de cidadania global. É um recurso inegável de empoderamento.
Além do Informe Anual, a Anistia Internacional nos proporciona a sua revista trimental, que já ultrapassa 100 edições e é acessível por meio do portal oficial da instituição na internet. Para um olhar único para a América Latina recomendo o texto situado na aba “Publicações” do portal, intitulado “Transformar dor em esperança. Defensoras e Defensores de Direitos Humanos na América”. Em suas 74 páginas, narram-se os testemunhos completos do valor pela defesa destes direitos inalienáveis.
Human Rights Watch
O documento completo, em inglês, da HRW para o ano 2014 tem 682 páginas; seu primeiro artigo, escrito pelo diretor executivo da instituição Kenneth Roth, está traduzido para o espanhol. O artigo parte do caso emblemático da Síria para discorrer sobre as áreas com maior incidência de violações dos Direitos Humanos no mundo – destacando em negrito os países implicados. Após isso, ele nos convida a compartilhar uma visão crítica em relação a duas instâncias: o Conselho dos Direitos Humanos da ONU, que vem recuperando sua credibilidade depois de um lento desgaste e a administração Obama, da qual analisar sua atuação quanto à violação de direitos sob o argumento da Segurança Nacional.
O informe prossegue com três outros artigos que antecedem uma interessante foto-artigo com três casos negligenciados de crise em Direitos Humanos (casamentos precoces no Sudão do Sul; o impacto das Olimpíadas de Sochi na Rússia para os Direitos Humanos; a tragédia humanitária na República Centroafricana), seguida da parte mais volumosa do Informe, dividida em seis regiões geográficas para os países examinados.
Além deste artigo, vale a pena checar dois documentos da HRW que aprofundam a crítica construtiva ao trabalho do Conselho dos Direitos Humanos da ONU. Os documentos se intitulam Curando a síndrome da seletividade, A Revisão de 2011 do Conselho de Direitos Humanos, Manter a dinâmica, Um ano na vida do Conselho de Direitos Humanos da ONU.
Departamento de Estado dos EUA
Outra referência valiosa para nosso objetivo é a apresentada pelo Secretário de Estado dos EUA, John Kerry. Como ele salienta no Prefácio do Informe intitulado “Relato por países sobre Práticas em Direitos Humanos”, correspondendo ao de 2013, comemoram-se os 65 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e o documento busca destacar a busca contínua de liberdade e dignidade igual em Direitos Humano em cada canto do mundo.
O Informe, de 19 páginas, começa com a menção às mais de 100 mil vítimas do conflito armado na Síria, onde o uso do gás venenoso sarin pelo exército sírio constituiu o mais letal ataque químico em décadas. Em consonância com este e outros atos desumanos perpetrados em vários lugares do planeta, lembra-se como signo de esperança “a primavera árabe”, iniciada em 2011; o respeito e a valorização expressos diante da morte do ícone dos Direitos Humanos, Nelson Mandela, a nomeação da pessoa mais jovem ao Prêmio Nobel da Paz, Malala Yousafzai, e outros mais.
A descrição do estado mundial dos Direitos Humanos para 2013 se agrupa em cinco áreas chaves, que são: 1. Uma ofensiva contínua dos Governos para garantir as liberdades de reunião e associação da sociedade civil; 2. As crescentes restrições à livre-expressão e à liberdade de imprensa. 3. Déficit de transparência nos abusos cometidos pelas forças de segurança; 4. Falta de proteção eficaz dos direitos trabalhistas; 5. A marginalização de grupos vulneráveis, particularmente: minorias étnicas e religiosas, mulheres e crianças, pessoas e comunidades LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transexuais) e as pessoas com deficiência.
Um subtítulo introduz cada área, depois da qual se ressalta em negrito o nome dos países onde ocorrem as violações, o qual permite uma leitura mais amigável e seletiva do informe. No final, as últimas 9 páginas destacam uma série de países one há problemas de Direitos Humanos que escapam à classificação mencionada ou onde há avanços significativos no assunto. Esta seção tem por eixo espaços geográficos: África, Ásia Oriental e Pacífico, Europa, Oriente Médio, etc. No hemisfério ocidental se destacam os casos de Cuba, Equador e Venezuela.
Como fonte complementar existe na rede a página do LANIC (Latin American Network Information Center), em espanhol e inglês, onde podemos encontrar uma ampla lista de recursos sobre Direitos Humanos tanto em nível regional (e para cada país latino-americano) como internacional (com referências gerais, além de publicações e subsídios para pesquisas).
José Manuel Fajardo
San Pedro Sula, Honduras