Ousemos seguir em frente!

 

Irmão José Augusto

Desde as primeiras culturas, as pessoas se estabeleceram em áreas seguras, mas depois de um certo período começaram a andar. Neste espaço sagrado de partilha, que é a Agenda Latino-Americana, quero trazer à memória o difícil caminho do povo hebreu rumo à terra prometida.
Dificuldades, pragas e perseguições marcaram essa caminhada. As dúvidas eram frequentes e desestabilizavam a todos. Tudo aconteceu e parecia que não tinha fim. Mas algo os marcou. É um fato que o maná os alimentou, que a água fluiu da rocha, mas algo mais forte os fez caminhar: a esperança. Esperança que trago aqui, não apenas como uma virtude teologal, mas como uma Esperança que os deixou desalojados com tantos desconfortos.
E hoje, nós, homens e mulheres de boa vontade, Povo de Deus em movimento, diante de tanta injustiça, perguntamo-nos: como caminhar quando parte de nossas forças parecem vazias, debilitadas e em vez de caminhar, paramos no meio do caminho para defender o básico? Não esperávamos estar à altura do aumento da desigualdade, dos desequilíbrios climáticos, das guerras e das ameaças nucleares globais. Não esperávamos experimentar mais dor, perdas, morte e com eles, o aumento da desigualdade social.
O Papa Francisco nos recorda que, como homens e mulheres de boa vontade, somos convidados a atualizar a nossa forma de vida. Não só com a solidariedade, tão desgastada pelos conceitos do "deus do mercado", mas do viver, afirmar e propagar a Justiça Social.
Solidariedade, que começa por sermos conscientes da forma com que consumimos. Somos parte do todo! Francisco de Assis inaugura em sua época, um movimento para olhar a Mãe Terra não com ares colonizadores, pelo contrário, nos convida a olhar com gratidão, generosidade e cuidado, toda a criação que está interconectada.
Cito Bertold Brecht, parafraseando-o: Tempos estranhos em que temos que defender o óbvio. Estes são tempos estranhos, sim, porém se olharmos com esperança, é um momento frutífero para transformar mentes, corações e práticas.
Nesta pandemia de Covid-19 que tem assolado a humanidade nos últimos anos, foram os movimentos populares, as organizações sociais, pastorais, as organizações eclesiais e as pessoas organizadas em movimentos as que nos ensinaram muito sobre o verdadeiro significado do Amor aos demais. Amor e cuidado pela criação.
Um dos maiores educadores de nosso tempo, Paulo Freire, nos disse que precisamos de esperança. Gerando esperança e contagiando, mesmo que o inverso pareça prevalecer.
Há esperança. Não podemos negá-lo. Necessitamos potencializá-la e organizá-la não com um 'utopismo' esvaziado, mas com uma utopia que surja de nosso povo, da indignação e necessidades básicas.
Outro mundo possível e justo é necessário. Digo mais: é urgente! Não podemos concordar com os pensamentos e ações excludentes. É nosso dever dialogar e agir de modo a transformar esta realidade tão perversa e imanente. Não podemos permitir que as dores de nosso povo sejam utilizadas como plataformas eleitoreiras, ou como mero trampolim para a chegada ao poder de grupos com interesses hostis, pois lamentavelmente o fascismo está cada vez mais presente.
Vamos celebrar as conquistas, que nos parecem poucas, é verdade. Mas temos que seguir em frente olhando a nossa história para não repetirmos erros, como o de sermos usados como meros objetos e, em seguida, descartados.
Juntos e irmanados nos completamos e caminhamos. Façamos da nossa vida luta, conquista e partilha. Semeando a boa semente. Nossa história é um terreno fértil. Recordemos os muitos homens e mulheres que fertilizaram o solo com sangue derramado. O solo é fértil para as transformações sociais. Gostaríamos de continuar adiante, até sermos livres, compartilhando lutas e sonhos.
Até que todos e cada um, não sejamos livres com terra, teto, trabalho, dignidade e pão em todas as mesas. Vamos dar esperança!