Uma Economia de Francisco para a América Latina

 

Tamiris Cristhina Resende

Humanidade Conectada: Geopolítica e Economia

Em uma América Latina marcada pela desigualdade social, há o convite para uma Economia de Francisco, que repensa a economia com o olhar para os mais pobres e os frequentemente excluídos da sociedade. Este convite vem do Papa Francisco que, em 1º de maio de 2019, escreveu uma carta convidando jovens pesquisadores, economistas e ativistas sociais a um encontro com ele em Assis, na Itália, para repensar a economia mundial.

O ano de 2020 ficará marcado para sempre como um símbolo do quanto nós, enquanto humanidade, estamos conectados. Uma pandemia de dimensões globais evidenciou a importância da saúde pública como um direito social e, ao mesmo tempo, elemento essencial para a estabilidade econômica. O chamado do Papa aos jovens foi profético. O evento previsto para 2020 ocorreu na cidade de São Francisco em setembro de 2022.

Assis é símbolo de reconstrução. Uma reconstrução se faz necessária para a América Latina, que está com as “veias abertas”[1].  É de Assis que vem um modelo para repensar a economia global que é tão conectada quanto excludente. São Francisco de Assis é claramente uma inspiração para o argentino Jorge Bergoglio, que escolheu, o nome Francisco.

No livro “Rethinking Economy Starting from the Commons: towards an Economics of Francesco”[2]  (Repensando a Economia começando pelos Bens Comuns rumo à uma Economia de Francisco), pesquisadores apontam a direção para uma economia com olhar aos mais pobres: a preservação dos bens comuns.

A “Tragédia dos Comuns” refere-se à situação em que, indivíduos com acesso a bens comuns, perseguem o seu próprio interesse em vez do bem público e, ao fazê-lo, em última análise, esgotam e depauperam um recurso que é de todos. A América Latina é afetada pela Tragédia dos Comuns. No início do ano passado, tornou-se pública a situação de fome e insegurança alimentar vivenciada pelos indígenas Yanomami. Uma situação agravada pela extração ilegal de minerais da floresta Amazônica.

A floresta Amazônica ocupa 49% do território brasileiro, mas também está presente em outros oito países: Peru, Venezuela, Colômbia, Bolívia, Guiana, Suriname, Equador e Guiana Francesa formando a Pan-Amazônia. Portanto, a floresta Amazônica pode ser considerada um bem comum latinoamericano e que precisa de soluções multilaterais para a sua preservação.

A preocupação com o contínuo desmatamento vem aumentando nas últimas décadas. A extração ilegal de madeira pela indústria madeireira e o garimpo ilegal está ameaçando a existência de comunidades indígenas tradicionais e de comunidades que vivem em harmonia com a floresta e dela dependem para viver. Além disso, a transformação de parte da floresta em pasto para a produção de carne em larga escala beneficia alguns poucos com a destruição de um bem comum que é de todos, reforçando as desigualdades sociais. A contaminação dos rios causada pela corrida atual por ouro e outros minerais preciosos é causa de doença na população indígena, que depende da floresta para a sobrevivência.

Tendo ciência de que tudo está conectado[3], a exploração desenfreada dos recursos da floresta Amazônica está colocando em risco a existência da humanidade. Não é ficção científica afirmar que, dentro das áreas ainda inexploradas da floresta, além de fauna e flora desconhecidas, pode haver vírus e doenças capazes de causar uma outra pandemia global.

Embora haja um pensamento comum de que os brasileiros deveriam ser os responsáveis pela preservação da Amazônia, a floresta é um bem comum não só do Brasil, mas também da América Latina e da humanidade. Sendo assim, os nove países que fazem parte do Ecossistema Amazônico, todos os países desenvolvidos que possuem recursos financeiros, instituições privadas, organizações não governamentais e movimentos sociais são chamados a tomar parte na preservação deste bem comum. Situações complexas exigem uma rede de cooperação multilateral, que consiga se sobressair ao utilitarismo que destrói e explora os mais pobres e excluídos.